Secovi São Paulo, 20 de abril de 2005
Os jornais publicaram com ênfase o julgamento, pelo Superior Tribunal de Justiça, do Recurso Especial 685.316, e a maneira como foi divulgada a decisão trouxe dúvidas a locadores e a locatários. Afinal, deve o inquilino pagar o IPTU? Teria o STJ inovado acerca da questão?
De início, cabe verificar qual foi exatamente a questão julgada. A prefeitura do Rio de Janeiro pretendia cobrar o imposto, apontou a cobrança ante a cessionária da área e não contra a proprietária (infraero) ou contra eventual possuidor por direito real: escolheu a ré, com base em cláusula do contrato celebrado entre cessionária e proprietária, segundo o qual cumpria àquela o pagamento do tributo; o Tribunal decidiu que a cobrança deveria ser impelida ante a proprietária, não ante a cessionária, confirmando quando decidira o Tribunal carioca.
A partir daí, foram veiculadas algumas afirmações que merecem leitura e esclarecimentos. Primeiro aspecto: o julgamento não afastou a possibilidade prevista no artigo 23 inciso I da Lei de Locações, vigente por força do artigo 2.036 do novo Código Civil, e é, portanto, legal que locador e locatário combinem a obrigação de o inquilino arcar com IPTU.
Ocorre que a prefeitura é credora do proprietário, e o dono do imóvel é credor do locatário. A primeira relação é prevista em lei, e a resultado de contrato feito de acordo com a lê. Esta certeza não foi abalada pelo julgamento.
Bem por isso, naquelas situações em que se estabeleça que o locatário arque com o IPTU, caso o imposto não seja pago, duas serão as conseqüências: o locador (proprietário ou possuidor por direito real) o pagará à prefeitura, sob pena de sofrer execução, e o locador poderá promover ação de despejo por falta de pagamento, cumulada com cobrança.
No julgamento tratou-se do artigo 123 do Código Tributário Nacional, que dispõe que os acordos particulares, ou seja, dos quais não participou o Poder Público, não possam ser alegadas para que a Fazenda Pública modifique o sujeito passivo (quem tem de pagar) das obrigações tributárias.
É disposição clara e perfeitamente coerente com a lógica que norteia não somente a relação com o Estado, mas igualmente entre particulares, que terceiro que não participou de um ajuste não seria obrigado por ele.
O tema leva a outro ponto importante: a decisão não afetou a certeza expressa no artigo32 do Código Tributário Nacional, ao fixar como fato gerador do IPTU “... a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou acessão física, como definido na lei civil...”. E é com base no artigo 32 do CTN que os tribunais têm decidido que o IPTU é responsabilidade do compromissário comprador ainda que o instrumento particular não tenha sido registrado.
Mas cada caso é um caso, e, em síntese, pode-se afirmar que parte da mídia noticiou situação que não foi a tratada pelo STJ.
É legal impor ao inquilino o pagamento do IPTU, bastando que isto seja disciplinado no contrato, obviamente somente celebrado após negociação dos interessados; nesta situação, caso o inquilino não pague o tributo, poderá sofrer ação de despejo por falta de pagamento cumulada com cobrança.
Se o proprietário, por sua vez, não pagar o imposto, estará sujeito a cobrança judicial promovida pela prefeitura, este o sentido da decisão em questão. Quando exista domínio útil ou posse (observados os critérios do Código Civil), o possuidor assumirá a legitimidade passiva, será definido como contribuinte do imposto (artigo 32, 34, 121 do Código Tributário Nacional), não se exigindo, para tal fim, a transmissão da propriedade regularizada através de registro imobiliário.
Em resumo, a decisão do Superior Tribunal de Justiça deu à questão interpretação baseada na legislação. As dúvidas decorrentes certamente aconteceram por equívoco na leitura da decisão
Jaques Bushatsky